Despedida

Nesse fim de semana mais um amigo partiu. Em um ano é mais um que parte fazendo uma das coisas que mais gostava, andando de moto.

Curioso. Ela não deixa de ser uma ferramenta que serve para abreviar o tempo dispendido para ligar dois pontos. Contudo, sua periculosidade vem abreviando vidas desde a sua concepção. Abreviando os momentos dispendidos com aqueles que amamos.
Abreviando o tempo curtido entre dois pontos.

O trânsito, de longe, é a forma que mais abrevia os contatos que tenho com aqueles que aprecio. Tá tipo 7 a 1. Aquilo que foi se desenvolvendo no intuito de facilitar o dia a dia, transforma-se em sofrimento devido a apenas uma distração, uma inconsequência, ou até mesmo uma fatal coincidência.

Fatalidade esta que por muitas vezes vem do outro, daquele que desconhecemos, mas que faz parte, assim como nós, da organicidade do trânsito. Estamos vulneráveis ao erro dos outros, assim como o contrário.

Mas a moto vai além disso. Ela não serve apenas para ligar dois pontos. O simples fato de você andar já é uma viagem. Você, muitas vezes, a pilota apenas pelo prazer de dirigir.

Isso tudo me deixa muito reflexivo. Também ando de moto. Diariamente. Também tenho filho. Dois. Uma mulher que amo demais. Pais e família maravilhosos, pelos quais nutro um sentimento de admiração e gratidão. E é recíproco. Se por ventura acontecesse algo, eu iria sim fazer falta. Assim como Celso está fazendo. Assim como Luizinho está fazendo.

Não tenho muita opção. Preciso da moto. Agilidade e economia. Moro em Sobradinho e frequento assiduamente a subida do Colorado. Geralmente percorro o trecho 2 vezes ao dia. Padrão. Porém tem dias que são 4, chegando a 6 vezes. Trânsito agarrado é mato. Preciso chegar aos meus destinos.

Todo esse contexto se agrava ainda com mal educação e a inconsciência do motorista brasileiro. Ultrapassagens pelo acostamento, falta de cortesia (este cidadão muitas vezes se indigna quando não são corteses com ele), uso de smartphone. Esse é um problema muito grave atualmente. Chego a dizer que tão grave quanto o álcool. E está generalizado nos dias de hoje. Diariamente flagro uns cinco motoristas fazendo barbeiragem, atrapalhando a fluidez do trânsito, colocando vidas em jogo, ao mexer na merda do seu celular. Pare, por favor. Eu sei que você faz isso.

Reconheço que não estava tendo muito contato atualmente com o Celso. Amigo da época do segundo grau, logo me chamou atenção pela sagacidade e presença. Não passava nunca despercebido. Entregava-se muito ao que fazia. Sempre o admirei muito por isso.

Ainda mais agora, defensor ativo da preservação dos recursos hídricos e das matas necessárias para esses. Mobilizou boa parte da comunidade nessa missão. O atual estado da quebra da 13 é consequência direta do seu empenho. O leito do lago está menos sujo devido aos seus esforços.

Porque, na moral, esta é a batalha mais importante de todas. Nada é mais importante do que a água. E a forma com que nós lidamos com ela é muito irresponsável. Ainda mais no Brasil, lugar onde não sabemos lidar com os recursos. Principalmente quando eles são abundantes.

Por enquanto. Semana passada já racionamento aqui..

Celso, o teu legado é muito importante. Brasília tem muito a lhe agradecer. Você fez a diferença aqui.

Que a sua partida sirva para que as pessoas olhem mais atentamente para as questões do trânsito e da água.

Quero deixar meus melhores sentimentos à família. Infelizmente não poderei ir ao velório, pois estarei cuidando do meu pequeno, Lucas, nome dado em homenagem ao meu irmão da vida que faleceu há alguns anos devido a um acidente também. Ele também fazia a diferença. Luizinho fazia a diferença. Gabriel Rascunho e Paulo faziam a diferença. Todos tiveram as suas presenças aqui abreviadas pelo trânsito.

Dizem que a morte é apenas a diferença entre você estar aqui e não estar mais. Então, nenhum de vocês morreram, porque todos estão dentro de mim.

Grande abraço para todos aqueles que estão sofrendo com a sua partida.

About Hugo De Marco

Hugo De Marco tem 34 anos mas parecer ter 28. Além de humilde e impaciente, é servidor público de profissão, historiador por graduação e são-paulino de coração. Ama a sua noiva e seus dois filhos (um ainda no forno). Além disso, também gosta de café, semear ironias, metáforas e, claro, a discórdia. Sempre teve as suas piores notas em Redação (por volta de 9,0). Apesar disso, com o tempo começou a estabelecer uma relação de amor com a escrita, chegando até ao ridículo de se referir em 3ª pessoa. Ansioso por natureza e palhaço por opção, foi votado como o mais comunicativo da 4ª série, ocasião em que falava merda no fundo da sala no intuito se autopromover. Pegou vício pela coisa e agora está aqui.
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